Autoestima tem sido um tema muito recorrente, talvez porque uma autoestima saudável está na base de uma vida bem vivida, de relacionamentos sustentáveis e de uma expressão afirmativa no mundo.
Ainda assim há muitos equívocos cercando a autoestima. Ela pode ser confundida com a autoimagem, associada com a aparência física, com o que se vê quando se olha no espelho. E mesmo uma autoimagem positiva não deveria se constituir em estar dentro dos padrões normativos, até porque são padrões excludentes que desconsideram a diversidade de corpos e tendem a ser racistas, gordofóbicos, transfóbicos e capacitistas.
A autoimagem se constrói pelo modo como uma pessoa vê a si mesma, em todos os aspectos e não só fisicamente. Em tempo, a autoimagem é somente um dos pilares que compõem a autoestima.
A autoestima é como um edifício que está em processo de construção infinita, desde o momento que viemos ao mundo, e que é formado por elementos e patamares diversos. Uma construção disruptiva que ora pode estar mais baixa, ora mais alta, até porque não somos tão estáveis como pretendemos e a vida não é tão linear como muitas pessoas gostariam que fosse.
A autoestima é uma habitação erigida a partir de algumas estratégias, mas que pode facilmente ser aniquilada por fatores externos se não for consolidada sobre uma base sólida. Por outro lado, como na história dos três porquinhos, o “lobo” pode soprar e soprar e soprar e não conseguir derrubá-la, se ela for consistente, quase inabalável.
Poder-se-ia dizer que a autoestima é um conjunto de qualidades que formam a avaliação subjetiva que uma pessoa tem de si mesma, que inclui o amor-próprio, a autoimagem, autoconfiança, autoaceitação e autocuidado. Parte-se do pressuposto que uma pessoa que se estima, sente amor por si mesma, aceita suas próprias características, bem como defeitos e limitações, reconhece e aprecia suas qualidades, tem uma boa visão sobre si mesma, confia em suas competências e é capaz de se cuidar e prover suas próprias necessidades, fazendo escolhas favoráveis à sua vida e ao seu bem-estar.
Parece muita coisa, não é mesmo? Isso é possível, sim, acredite. E toda pessoa tem direito a gozar de uma autoestima positiva e construtiva.
A autoestima depende em grande parte do nosso autoconhecimento e do nosso sistema de crenças e em parte da avaliação e aprovação dos outros. Ela se manifesta em nossas escolhas, hábitos, comportamentos e relações. E por ser subjetiva e flexível, pode ser constantemente moldada, para o melhor ou para o pior.
A autoestima é uma edificação que se inicia em nossos primeiros anos, a partir do modo em que as pessoas que cuidam de nós nos tratam e vai sendo construída ao longo de nossa vida com nossas experiências sociais.
O meio em que vivemos é determinante para a construção de nossa autoestima, bem como os modelos que seguimos, sejam eles das pessoas mais próximas ou até mesmo as que admiramos através das mídias. Por isso a representatividade é tão importante para a autoestima das pessoas.
A nossa autoestima pode florescer em relações construtivas ou degenerar em relacionamentos tóxicos ou abusivos. É preciso ter atenção aos estímulos positivos e gatilhos negativos que nos afetam, escolhendo a companhia de pessoas que nos aceitam como somos, nos respeitam, admiram, apoiam e estimulam. E os modelos que nos representam.
A esta altura, você pode estar se perguntando a quantas anda a sua autoestima, se seus relacionamentos atuais a apoiam ou não. Talvez possa estar se lembrando de como sua autoestima foi sendo moldada na sua infância e adolescência e como foi se definindo em sua idade adulta. E talvez possa também refletir sobre se as pessoas que você admira e segue nas redes sociais realmente representam você, seja fisicamente ou em ideais, crenças e valores.
Esse é um excelente exercício de auto investigação, que pode dar pistas sobre muitos outros temas em sua vida, como os padrões repetitivos de seus relacionamentos ou de suas escolhas, sejam elas pessoais ou profissionais e sobre o modo que você se sente sobre si e como cuida de si.
Se você teve a boa sorte de nascer em uma família amorosa que apoiou o seu crescimento, respeitando sua individualidade, se teve relacionamentos saudáveis com pessoas que respeitavam você, se você se sente pertinente ao meio que participa, tem um sentimento de adequação e se sente bem sobre quem você é, se você sente que tem representação na sociedade, gostaria de lhe convidar a pensar sobre todas as pessoas que não tiveram essa mesma bem-aventurança.
Pense em todas as pessoas que não tiveram as mesmas oportunidades de construir uma autoestima positiva por não terem tido um lar, uma família estruturada e sua infância resguardada, por não sentirem que foram aceitas e amadas como são, por sofrerem desrespeito, preconceito e todo tipo de violência, por não se sentirem representadas em uma sociedade que as segrega e as exclui dos sistemas que garantem benefícios, educação, direitos, empregabilidade, proteção, saúde e bem-estar.
Estamos encerrando o mês do orgulho LGBTIQA+ e é essencial falarmos sobre a autoestima das pessoas que fazem parte de um ou mais grupos representados pela sigla deste movimento.
E por falar em sigla, hoje ainda, após tanta luta e com tanta informação disponível, ainda vemos pessoas confortáveis na cisgenereidade e heteronormatividade, questionando o porquê de tantas letras nesta sigla. Em geral, essas são as mesmas pessoas que tendem a confundir orientação sexual com identidade de gênero e que, no alto de seu privilégio, classifica existências e expressões diferentes da sua como modismo, rebeldia ou, segundo sua estupidez violenta, “ideologia de gênero” ou “ditadura gay”.
Algumas delas que ainda mostram uma preguiça patente de se informar sobre o tema, parecem estar sempre prontas a dar opinião sobre assuntos que não dominam, escrever textão em rede social com viés ideológico ou criticar outras pessoas de forma virulenta e sem embasamento, simplesmente porque não coadunam com sua visão estreita de mundo.
Sim, eu sei que é natural temer o que não entendemos, mas daí a ter uma reação violenta a isso, são “outros quinhentos”. Porque o que incomoda em outra pessoa fala mais sobre quem está incomodado do que sobre a pessoa.
Em tempo, ser uma pessoa heterossexual e cisgênera só é um privilégio em uma sociedade que entende isto como norma.
Fosse isso diferente, não seria necessário ter datas para lembrar as pessoas da importância do respeito a alteridade. Se os princípios de liberdade e equidade fossem seguidos, não precisaríamos lutar por direitos LGBTIQA+. Ademais, todas as pessoas que se reconhecem LGBTIQA+ teriam uma autoestima elevada e se sentiriam representadas.
Enquanto não alcançamos isso, seguiremos lutando por direitos, representatividade e visibilidade. E para a construção de uma autoestima inabalável.